Dia
4 de abril deste ano 2018 de Nosso Senhor, se deu um dos julgamentos
mais esperados em torno do objeto contraditório da PRESUNÇÃO DE
INOCÊNCIA, com fulcro objetivo no Habeas Corpus preventivo do
ex-presidente Lula.
Esta discussão precisa abordar 3 pontos:
- As
abordagens ambíguas da Constituição de 1988, impropriamente chamada de
Constituição Cidadã, porém repleta de manobras com objetivos bem
definidos;
- O Princípio inadequado e mal denominado de Presunção de Inocência;
- Princípios
e Sistemas criados pelos juízes do Supremo para afastar cada vez mais
os leigos da interpretação correta de uma Constituição (Presunção de
Inocência, Sistema de Repercussão Geral, Pena aplicável de acordo com a
capacidade de Encarceramento);
As impropriedades e ambiguidades da CF 1988
Uma
Constituição é uma Norma, ou seja, uma direção. O cotidiano jurídico e
particularmente do judiciário se constitui num Universo de
possibilidades quase infinitas, sujeito às incontáveis mudanças da
Sociedade e à criatividade imponderável dos advogados de defesa.
A
forma da redação da Constituição Cidadã rompeu o estilo das
constituições anteriores, em que havia uma Norma seguida do "salvo se",
ou seja, das exceções, para dar lugar às enumerações. Estas criaram a
perigosa abordagem de FOCO RESTRITO, armadilha em que o próprio ministro
Marco Aurélio caiu durante seu voto no julgamento em tela.
Ao
proferir o seu voto, o ministro Marco Aurélio argumentou que a tarefa
seria bem f´fácil, devido à clareza do texto constitucional:
Artigo 5º, inciso ...
LVII – ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória;
e no mesmo artigo:
LXI
– ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e
fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de
transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;
e
LXV – a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;
Os
ilustres magistrados que, a guisa de defender os pobres e os humildes,
querem a todo custo protegê-los de "prisões injustas", caem na armadilha
das enumerações, focando em um tópico, sem pesar, em suas
argumentações, os outros dispositivos, alias atados ao mesmo artigo, o
que os torna indesculpáveis.
Se
o ministro Marco Aurélio leu o inciso LVII e sobre ele construiu todo o
seu discurso, deveria ler os demais, LXI e LXV, para balancear
corretamente os dispositivos. Mas além disso, não deveria cair, como o
ministro Dias Toffoli, na aplicação do direito condicionada à capacidade
das carceragens brasileiras. Este argumento falacioso coloca o Brasil
em perigo de caos social e de Insegurança Jurídica. Imaginem,
condicionar as prisões ao número de vagas. Cabe ao Estado providenciar
estas vagas. Cabe ao judiciário acionar o Executivo caso este não
providencie o devido aparato de encarceramento.
O
ministro Dias Toffoli, contaminado pela onda de discursos politicamente
corretos e pelas perigosas teses dos Direitos Humanos, quase quis dar
salvo conduto a todos os indivíduos candidatos a vagas na prisão,
notadamente aqueles poderosos, colegas de partido (ele é do PT), num
jogo de conveniências. Ele reclamou das condições precárias nos
presídios, mas em seus lembretes sempre iniciados pela expressão "por
outro lado", deveria também lembrar das atrocidades que estes indivíduos
fizeram quando do cometimento de seus crimes (das vítimas os Direitos
Humanos nunca lembram).
Como
sempre em meio à confusão, surgem as vozes da lucidez, cabe citar o
ministro Luis Fux, que evidenciou o "excesso de foco" em um só
dispositivo. Ele perguntou "Onde está, na Constituição, a
impossibilidade, a interdição de execução de um acórdão condenatório que
confirma a sentença condenatória, que acolhe uma denúncia antecedida de
um inquérito? É uma presunção de inocência que o mais tenro fundamento
científico, a não ser a Declaração Universal. Ou seja, considera-se
presumidamente inocente um homem até que ele seja considerado culpado. E
isso faz sentido."
Em torno da Presunção de Inocência, construiu-se
um "escudo angelical" em torno dos homens, tanto os honrados quanto os
perversos, e estamos cansados de saber que os seres humanos assumem
vocações tanto para um lado quanto para o outro.
O rito jurídico
Alguns
magistrados, bombardeados pelos discursos da midia, em torno das
cadeias superlotadas, de alguns inocentes que foram condenados, da ampla
maioria que não tem dinheiro para pagar advogados caros, se esqueceram
de que existe o Código de Processo Penal, com a sequência padronizada de
procedimentos, que passam pelo Oferecimento da Denúncia,
Estabelecimento de um Processo, Sorteio da Vara que vai abrigá-lo,
Inquérito com as diligências e perícias, oportunidade de ampla defesa em
um julgamento (que por sua vez tem um rol padronizado de providências).
Acrescente-se a isto a possibilidade de revisão, recursos, habeas
corpus e apelações a instâncias superiores.
Todo
este rito valida, de forma justa e igualitária, com advogados
escolhidos ou outorgados pelo Estado, tanto a sentença quanto a pena. E
depois de condenação na primeira instância, e revisão com manutenção
desta mesma, onde será que resta a Presunção de Inocência ?
É
isto que os ministros Barroso e Fux colocaram, o primeiro de forma
clara, e o segundo de forma um pouco mais jurídica. E o ministro Barroso
lembrou que, com a farra dos recursos múltiplos e intermináveis, em
nome da Presunção da Inocência, chega-se à prescrição, e o sabido
culpado não passa nem uma noite na cadeia.
E
ainda o esclarecido ministro Barroso lembra que, se a Constituição é um
dispositivo fechado e auto-suficiente, como ressaltou o ministro Marco
Aurélio, ela mesma enumera os casos em que é preciso ter uma reserva
antes da decretação de prisão, como o Foro privilegiado. Ex-presidente,
ex-senador e ex-deputado não gozam desta prerrogativa.
Os três equívocos de Lewandovski
Nas escrituras bíblicas, alguém diz ao apóstolo Paulo: "As muitas letras te fazem delirar".
O ministro Lewandovski, pelo menos neste julgamento, deu claro exemplo deste delírio, vejamos o que ele disse:
- "Prisão é EXCEÇÃO e Liberdade é REGRA.";
- "Algumas súmulas poderiam ser declaradas ilegais";
- "A presunção de inocência é parte dos direitos e garantias individuais";
Estes
são exemplos de como alguém pode usar a letra da Lei, de forma
enfática, em momento absolutamente errado. É o mesmo que elogiar o
praticante de roleta russa que aperta o gatilho mas não é alvejado, pois
a bala não está na posição correta. É preciso apontar a arma para um
alvo válido, para que ela confirme a sua eficácia.
Como falar, sem dizer nada
Se
quiser aprender como falar, sem dizer nada de aproveitável, em uma
proporção aceitável, leia ou assista pelo Youtube o parecer e voto do
ministro Toffoli.
Qualquer
curso que ensina a falar em público tem como a primeira premissa a
seguinte máxima: Fale de forma que a plateia possa te entender.
Este
ministro falou de autores, falou de teses, citou casos de sua vida,
envolvendo aqueles que o ajudaram a se formar como advogado e juiz, foi
para um lado e foi para o outro, mas não disse absolutamente nada de
aproveitável para a audiência. Seu único objetivo era votar a favor do
habeas Corpus.
O Pavão
De quem estaríamos falando ? A quem estaríamos nos referindo ?
Se pensaram em Gilmar Mendes, entraram em sintonia com o âmago deste artigo.
Um
Magistrado precisa estar em comunhão com o povo. E ele ainda brada aos
quatro ventos: "vivemos numa democracia". Do que estará falando este
cidadão ? Se existe um órgão pouco democrático, este poderia ser o STF.
Ninguém ali é escolhido pelo povo, e sim pelo executivo, em torno de
seus próprios interesses. Não, o STF não atende aos requisitos de uma
democracia. E nem precisa. O que é preciso é que o STF seja a seleção
dos melhores e mais imparciais magistrados de nosso país, e que aceitem
serem os zeladores de nossa constituição, aliado ao propósito de
colaborar para a manutenção da ordem social.
O
Sr. Gilmar Mendes certamente não atende a este requisito, pois revela
claramente um descompromisso com a nação. Uma das provas reside no
momento em que criticou a pressão popular. O povo é o elemento
constituinte da nação, a quem ele serve. O que ele pretende ?
"As
prisões automáticas empoderam um estamento que já está por demais
empoderado. O estamento dos delegados, dos promotores, dos juízes. Por
que se essa mídia opressiva nos incomoda, estimula esse tipo de ataques,
ataques de rua... (...) É preciso dizer não a isso. Se as questões
forem decididas na questão do par ou ímpar, (...) é melhor nos
demitirmos e irmos para casa. Não sei o que é apreender o sentimento
social. Não sei. É o sentimento da mídia? "
Ele
esquece a quem sua função serve ? Mídia opressiva ? Só existe uma
explicação para isto. Mesmo trabalhar na mais alta corte de um país
acarreta e envolve cobrança. Não é uma função de poder em si só. É uma
função simples de serventuário da justiça. Gilmar deveria descer do
pedestal de magistrado para a de serventuário, e desta forma não teria
estes conflitos, e nem falaria em se demitir.
"Se
um tribunal for se curvar a isso, é melhor que ele desapareça. É melhor
que ele deixe de existir. Em matéria criminal, a coisa mais sensível?
Julgar segundo o sentimento da rua não dá, não é possível. E eu não
preciso ir muito longe nisto. Os nazistas já defenderam isso. A ideia do
volksgeist vai ser absorvida em um sentido perverso. O bom volksgeist
de Savigny vai virar uma coisa escabrosa, não se pode falar disso sob
pena de comprometer a democracia."
Engano
de Gilmar Mendes. Os nazistas não se curvaram ao povo. Eles induziram
uma ideologia aos cidadãos da Alemanha, através de propaganda maciça,
impondo o pensamento do Partido Nazi. Savigny foi um competente jurista
alemão, talvez o maior de todos. Sua ideia de Volksgeist era a de não
tirar as interpretações diretamente de um código, mas também do espírito
do povo.
Nosso
ilustre magistrado Gilmar Mendes se esquece de onde se originam os
códigos. Se um grupo de especialistas em princípios do direito de uma
nação se reúne, é óbvio que deixarão na lei um pouco de seu espírito,
pois eles pertencem ao povo. Gilmar Mendes já se considera, como juiz da
suprema corte, ALGUÉM QUE NÃO PERTENCE MAIS AO POVO. Ele se julga
membro de uma elite a parte do povo, tanto que disse, em palavras
textuais:
"Não sei o que é apreender o sentimento social. Não sei. É o sentimento da mídia?"
E
mais: "Se um tribunal for se curvar a isso, é melhor que ele
desapareça. É melhor que ele deixe de existir. Em matéria criminal, a
coisa mais sensível? Julgar segundo o sentimento da rua não dá, não é
possível."
Ele julga não mais pertencer ao povo. Ele despreza o povo.
Considerações Finais
A
ministra Carmem Lúcia salvou o que resta de honra do STF, repudiando o
Habeas Corpus, e abrindo o caminho para a prisão em segunda instância,
evitando, daqui para frente, as prescrições dos processos pela
morosidade que grassa em nossos tribunais, e mostrando que a justiça não
se distribui com base no número de vagas de nossas prisões.
Nossos
juízes ainda não compreenderam que devem pesar, como mostra a balança
da justiça, a Lei com a Ordem Social. De que vale manter a Lei, se esta
manutenção se der à custa de um caos social ?