Em todo o momento em que estiver lendo este artigo, tenha em mente os contextos e situações bizarras pelas quais o Brasil está passando nesta década que se iniciou em 2010. Há muito as contradições sobre o assunto que vamos tratar apareceram, mas nesta década elas assumiram seus contornos mais graves e dignos de nota.
A face psicológica
Não é o objetivo deste texto tratar do lado psicológico da questão, mas vale a pena ler um dos textos mais esclarecedores, sem abordagens superficiais de artigos politicamente corretos que se encontra aos montes na Internet:
O aspecto psicológico da Autoridade
Os 4 Bens jurídicos administrativos
Pode parecer estranho tratar, no meio jurídico, de bens que mais parecem psicológicos do que algo que se relacione com alei. Para isto vamos considerá-los como bens jurídicos do Direito Administrativo.
Vamos procurar a sua materialidade na Administração, como algo realmente nascido de propósitos práticos, fruto de necessidades reais da humanidade em algum momento da história. Sim teremos que recorrer à história para procurar as raízes materiais destes bens. Comecemos por aqueles que tentaram organizar a Filosofia e a Política, que deram origem ao Direito como conhecemos hoje.
Recorrendo aos gregos
Os gregos estabeleceram bases consistentes, através do pensamento puro, para a compreensão de conceitos que, aprofundados, derivaram para a Psicologia, Antropologia e Sociologia, desaguando nos alicerces de nosso Sistema Político. Mais adiante, o sistema político foi copiado para o sistema empresarial, para possibilitar a direção organizada tanto das instituições mais complexas até os prosaicos clubes, associações e condomínios prediais.
Mas por que foi criado o Sistema Político ? Alguém se lembra disso ?
A propriedade da Terra
Ele foi criado devido a algo bem óbvio, e por esta razão, difícil de se determinar: a propriedade da terra. Uma vez que um grupo (tribo) chegasse a um pedaço de terra, e ali se estabelecesse, temporária (nomadismo) ou permanentemente (sedentarismo), estaria sujeito a ser dali retirado à força.
Quem poderia dizer que a terra era sua de verdade ? Onde estaria registrada esta posse ? Quem seria o fiel detentor da informação a respeito do proprietário legítimo desta terra ?
Somente alguém conhecido e reconhecido como pessoa de confiança por um conjunto razoável de pessoas em um contexto regional com extensão razoável definido poderia afirmar com certeza a propriedade de fato de um pedaço de terra. Primeiramente a Autoridade para deliberar sobre isto residia em um Conselho de líderes tribais, cada um o patriarca mais velho da tribo.
Posteriormente, as nações passaram a designar um Rei, este sim proprietário de todas as terras, e que dispunham dela de acordo com seus interesses, auferindo seus ganhos. Os gregos e romanos corrigiram esta anomalia, retornando a propriedade da terra para famílias independentes, estabelecendo as leis específicas para isto.
A Autoridade persistiu
Mas uma vez transferida a responsabilidade da determinação da propriedade da terra para as Leis, a Autoridade apenas mudou de forma. Perdeu-se totalmente a figura de um representante humano da Autoridade ?
Para discutir isto temos que lembrar de um fator, agora geográfico, relacionado à propriedade da terra: a Urbanização. Se justamente a Autoridade surgiu para resolver disputas de terra, e isto conduziu às leis, estava aberta a possibilidade de várias famílias poderem ocupar uma terra produtiva e boa, sem que os conflitos se transformassem em guerras. Todos podiam usufruir de uma região próspera.
Mas agora ficava difícil, com várias famílias envolvidas, quando surgisse uma disputa, tomar uma decisão. Haveria também os que não quisessem se envolver, devido a uma ou várias conveniências. Era preciso designar os representantes da Autoridade bem como os legisladores.
O caso hebreu
Voltemos a mais de 3700 anos atrás, para a tenda do grande legislador Moisés. Ele se encontra praticamente sufocado com tantas querelas envolvendo tanto terras quanto gado quanto pequenos delitos.
Então, o sogro de Moisés, Jetro, o aconselha a estabelecer as leis e estatutos para o povo, e a designar alguns membros mais capazes entre o povo, para ajudá-lo na tarefa. Em caso de dúvida quanto ao julgamento, eles recorreriam a Moisés. Moisés ficava na posição de cabeça dos chefes. Iniciou-se, assim, a hierarquia vertical das instituições.
O caso Romano
O Império Romano, de modo diverso ao caso Hebreu, iniciou sob a forma Monárquica (753-510 a.C.). Abaixo do Rei existiam os Patrícios (famílias tradicionais, proprietárias das terras) e a Plebe.
Em 510 a.C. a República foi implantada num sistema de governo exercido por 2 cônsules em períodos de tempo alternados, e não simultaneamente. Abaixo deles estava o senado, com seus 300 senadores escolhidos entre os Patrícios (que tivessem o dinheiro necessário para pagamento do cargo). Em seguida vinham os Magistrados, exercendo as funções executivas e judiciárias. Abaixo estava a Assembléia Popular composta de Patrícios e de Plebeus.
O Conselho da Plebe elegia os Tribunos da Plebe, e estes não estavam submetidos à autoridade dos Cônsules, à semelhança dos Conselhos das Instituições modernas, onde o Conselho não se submete ao Presidente e nem à Diretoria das empresas e das instituições. O modelo Romano vem se perpetuando nos tempos. Notadamente este modelo se mostra vertical, com a Assembléia Popular agindo como Poder Moderador.
Decadência da Organização Administrativa
Após a queda do Império Romano como Instituição e da República Romana como forma de governo, os chamados povos bárbaros resolveram, por puro orgulho, não viver como romanos, mas viver conforme o costume tribal, composto por chefes locais, nem sequer Reis. Isto foi um enorme retrocesso. Estes povos não quiseram, de forma alguma, aproveitar as conquistas romanas, alcançadas a duras penas, e que levavam a uma organização eficiente dos poderes de cada nível hierárquico.
Sempre que o modelo hierárquico é rompido, ou se busca uma outra forma de governo, observa-se, na história, notadamente da Europa, o retorno do simples mando do mais forte ou do mais rico, com o restabelecimento do modelo monárquico, trazendo todas as mazelas pertinentes.
Não se pode comparar Roma aos governos caóticos que lhe sucederam. Tanto isto é verdade que séculos depois a forma Romana de República venceu.
Thomas Hobbes
Cerca de 200 anos depois da queda do Império Romano, Thomas Hobbes, filósofo inglês, propôs uma forma de Governo forte pois, segundo suas palavras, "
a maldade inerente aos homens conduziria à destruição recíproca dos indivíduos". Hobbes vivia debaixo do governo Monárquico de Carlos II, quando escreveu o Leviatã em 1651, onde discutia esta questão.
Autoridade e Responsabilidade
Adiamos o momento de definir Autoridade, porque ele só faz sentido, para nosso objetivo, após as notas históricas anteriormente colocadas. Autoridade é o "poder legítimo", "o direito de mandar", ou seja, o direito de mandar e de ser obedecido. Vimos que a Autoridade nasceu da incerteza quanto à propriedade da terra, e que OS PRÓPRIOS HOMENS DECIDIRAM DEFINIR ALGUÉM com a notoriedade necessária para declará-la de fato. Em princípio podemos dizer que os homens sentiram esta necessidade, mas de forma mais madura percebemos que esta é só uma faceta de uma necessidade maior, ou seja, a da existência de um cabeça.
Como compensação, pode-se exigir desta Autoridade o dever de responder pelas ações dos outros. No caso da divisão da terra, se alguém invade a terra de outrem, a Autoridade reparte a Responsabilidade da invasão com o invasor, pois o representante da Autoridade é o procurado. É como o caso de um morador que danifica o portão de seu prédio em segredo. Querm será procurado ? Certamente será o síndico.
Tal é paridade entre Autoridade e Responsabilidade. A Autoridade aceita a culpa coletiva. Então existiria algo mais cômodo do que estar debaixo de uma Autoridade ? É uma comparação exagerada, mas como teremos que falar de Obediência, vamos citar a menoridade. Quando a pessoa é de menoridade, são os pais que respondem por seus atos. Existe algo mais confortável do que isto ?
Para retribuir esta comodidade, este conforto, o que é que o subordinado deve dar em troca ? Obediência. Esta é o comportamento de quem tem um mais capaz para recorrer em caso de necessidade.
Lei e Autoridade
Conforme o sonho do filósofo Espinoza, que disse que "
se tudo dependesse da vontade de um só, nada seria estável". Para deter este "perigo" é que foram feitas as leis. Espinoza estava preocupado com os déspotas. Mas pensemos e façamos a pergunta:
QUEM PODE DECIDIR AQUILO QUE A LEI NÃO PREVIU ?
Para isto existe um representante humano da Autoridade, reconhecido como sendo capaz, a quem esta mesma Autoridade foi dada voluntariamente.
As Leis das Instituições e das empresas emanam, todas elas, de princípios que deram origem, nesta ordem, à Constituição Federal, aos Códigos (Civil e Penal). Nem todas as instituições possuem um corpo jurídico capaz de prover um Regimento ou Estatuto sem falhas de interpretação.
No caso da direção das instituições devem sempre valer os Princípios da Hierarquia, da Autoridade e da Obediência. Sendo estes princípios do Direito, não se escrevem, não se explicitam, pois se o fosse poderia tornar os Códigos resultantes até ridículos e ofensivos. Quem não sabe que o filho deve obedecer ao Pai, o aluno ao professor, os Ministros ao Presidente, os Diretores ao Presidente e os empregados aos seus chefes nas empresas ?
Se falamos de Lei e de Autoridade, os atores necessários (empregados, gerentes, diretores, superintendentes e chefes de departamento) devem ter a consciência da ...
Obediência e Respeito
A
Obediência é o vínculo óbvio entre os níveis hierárquicos verticais da empresa, enquanto que o
Respeito é o vínculo óbvio tanto vertical quanto horizontalmente na hierarquia. Obedecer é sujeitar-se à vontade de outrem. Mas nas organizações (instituições ou empresas) a sujeição não é imotivada e sem um objetivo. Nestas a sujeição se dá por aceitação contratual. Discute-se se é preciso ser remunerada. A dúvida não procede, pois a aceitação da sujeição sem remuneração envolve mais responsabilidade pois tem maior coeficiente voluntário, portanto é uma decisão mais sólida, pois o que se sujeita o faz de maneira nobre, pois sabe que não vai receber retorno financeiro.
É um erro interpretar o trabalho voluntário como algo que se pode largar a qualquer hora, pois o que se sujeita não está ganhando nada. As empresas, atualmente, em suas entrevistas de seleção, estão dando mais valor aqueles que já tenham trabalhado de forma voluntária, contanto que devidamente comprovado.
Hierarquia
Como um bem ordinário, a Hierarquia é a forma de organização de uma Instituição ou Empresa. Como um "bem jurídico", pois só assim fica mais solidamente definida, a
Hierarquia é a melhor forma de fluxo da
Autoridade, pela
Obediência e pelo
Respeito.
A Hierarquia pode estar mapeada em um gráfico, mas não produzirá efeito nenhum sem a Obediência nos níveis verticais, e sem o Respeito nestes mesmos níveis acrescidos dos níveis horizontais.
E finalmente a Autoridade
Anteriormente colocamos conceitos e derivações de Autoridade, sem compreendê-la de forma realmente instrumental. A Hierarquia surgiu como materialização de conceitos mais humanos como Obediência e Respeito, para mostrar, em seu topo, e a cada nível, as Autoridades de cada patamar.
A
Autoridade é um misto de abstrato (nas Leis, Códigos, Regulamentos, Normas) e concreto (cargos), e se complementam com o elemento humano que a exerce, por um determinado período, em um determinado lugar.
Considerações finais
Mostramos a origem, a conceituação e a relação entre os constituintes do bem jurídico mais precioso para o andamento das Instituições e Empresas: a Autoridade. Mostramos seu estabelecimento pela Hierarquia, sem o que ela simplesmente não aparece, não se manifesta com eficácia.
_________________________________________________________________________
Referências:
Alessandro de Franceschi - Administração e Organização do Trabalho
Beatriz M. de Souza WAHRLICH - Uma Análise das Teorias da Organização
Celso Antônio Bandeira de Melo - Curso de Direito Administrativo
Geraldo Aymoré de Araújo Gama Júnior - Aplicação do Poder Hierárquico na Administração Pública
Heitor Borba - Autoridade x Responsabilidade
Idalberto Chiavenatto - Introdução à Teoria Geral de Administração
Lexikon - Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa